BRUNO SILVA
GUIA DE TURISMO HABILITADO NO MINISTÉRIO DO TURISMO
PERNAMBUCO, BRASIL e AMÉRICA DO SUL
ESPECIALIZADO: TURISMO RECEPTIVO, PEDAGÓGICO, HISTÓRICO, CULTURAL, ECOTURISMO e EXCURSÕES RODOVIÁRIAS
A culinária pernambucana foi se fazendo aos poucos. Resultado do especial relacionamento com o meio ambiente. Primeiro usando alimentos da própria terra. Depois aproveitando ingredientes e conhecimentos de longe. Feita, sobretudo, do fino equilíbrio entre as cozinhas portuguesa, indígena e africana. Tudo na medida certa e com muita harmonia. Generosa, forte, afirmativa. Imagem e semelhança de nossa gente.
Cada região tem uma culinária própria. No Sertão o café da manhã é a refeição mais forte, a que dá sustança para enfrentar o dia – angu, cuscuz de milho ou mandioca, grude, tapioca; banana-comprida, batata-doce, fruta-pão, inhame; coalhada, ovo, pão, papa (de aletria, araruta, sagu), queijo assado de coalho ou queijo de manteiga (também conhecido como queijo do sertão). E charque frito, cabrito ou bode guisado. Acompanhando café, leite ferrado (com ferradura em brasa jogada dentro do leite), leite queimado (com açúcar caramelizado) ou mesmo café com leite – muitas vezes adoçado com rapadura, mais nutritiva e saborosa que açúcar. Almoço também forte: buchada, chambaril, cozido, dobradinha, mão-de-vaca, rabada, sarapatel. Tripa de porco (assada e misturada com farinha). Ainda bode, cabrito, carneiro ou porco guisado, carne de sol, charque, galinha (assada, guisada ou de cabidela) Feijão também, com seu preparo incorporando ingredientes próprios da região – pedaço de charque, costeletas de porco, linguiça, osso de tutano, paio, toucinho; e couve, jerimum, maxixe, quiabo. Mais farinha de mandioca preparada de muitas maneiras: simples, de bolão, de jerimum, de batata-doce. E pirão, para acompanhar cozido, galinha ou peixe. A refeição se completa com lapadas de cachaça, pra ajudar na digestão ou por gosto. No fim do dia, uma ceia servida cedo – na “boca da noite”, como se diz por lá. Em que sopas de batata, feijão, jerimum, milho, verdura, ou canja de galinha se juntam a pratos também servidos no café da manhã.
No Agreste os hábitos alimentares são bem parecidos com os do Sertão – café da manhã farto, almoço pesado, ceia generosa. Nessa culinária se abusa do sal, usado para fazer carne de sol e charque – com mantas expostas ao vento, pra secar. O milho está presente em todas as mesas. Sempre muito. E de todo tipo: assado, cozido ou no angu, no bolo, na canjica, no cuscuz, no mungunzá, na pamonha. Mandioca também, sobretudo em grudes, tapiocas e beijus. Também queijos – preparados na própria região.
Bem diferente é a Zona da Mata. Com economia concentrada na agroindústria canavieira, ainda hoje refletindo a opulência de outros tempos. Tradições entranhadas na alma. Aí surgiu uma das mais importantes doçarias do mundo. Às vezes copiando velhas receitas portuguesas, ou substituindo ingredientes das receitas do colonizador por produtos da nova terra. Aqui também nasceram bolos e doces inteiramente nossos. Muitos deles com nomes das famílias ou dos engenhos onde foram concebidos. Segredos passados verbalmente, de mãe para filha: por não saberem escrever as mulheres da época; ou pra esconder receitas de cada engenho ou família.
E é só assim – juntando ingredientes de cada uma de nossas regiões, e receitas tradicionais que têm a marca de nossa história – que poderemos compreender a terra em que vivemos e o verdadeiro espírito de nossa gente.
Lectícia Cavalcanti
Pesquisadora de gastronomia pernambucana